Atividades propostas pelos prof.s de Língua Portuguesa do AECC

Propostas de atividades sugeridas pelos professores de Português e pelos Professores Titulares de Turma: Bons nas Rimas; Trava-Línguas; Escrever à maneira...do poeta preferido; Poema para uma letra; Construir um hai-cai; Poema para um nome; Poesia Visual...

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Em fevereiro acontece...

CALENDÁRIO DE EFEMÉRIDES
José Gomes Ferreira (Porto, 9 de Junho de 1900 - Lisboa, 8 de Fevereiro de 1985) foi um escritor e poeta português cuja obra ocupou praticamente todo o séc. XX.


Entrei no café com um rio na algibeira
Entrei no café com um rio na algibeira
E pu-lo no chão,
A vê-lo correr
Da imaginação…

A seguir, tirei do bolso do colete
Nuvens e estrelas
E estendi um tapete
De flores
A concebê-las.

Depois, encostado à mesa,
Tirei da boca um pássaro a cantar
E enfeitei com ele a Natureza
Das árvores em torno
A cheirarem ao luar
Que eu imagino.

E agora aqui estou a ouvir
A melodia sem contorno
Deste acaso de existir
- onde só procuro a Beleza
Para me iludir
De um destino.
   José Gomes Ferreira


José Joaquim Cesário Verde (Lisboa, 25 de Fevereiro de 1855 - Lisboa, 19 de Julho de 1886) foi um poeta português, considerado um dos precursores da poesia que seria feita em Portugal no século XX.

Contrariedades
Eu hoje estou cruel, frenético, exigente;
Nem posso tolerar os livros mais bizarros.
Incrível! Já fumei três maços de cigarros
Consecutivamente.

Dói-me a cabeça. Abafo uns desesperos mudos:
Tanta depravação nos usos, nos costumes!
Amos, insensatamente, os ácidos, os gumes
E os ângulos agudos.

Sentei-me à secretária. Ali defronte mora
Uma infeliz, sem peito, os dois pulmões doentes;
Sofre de faltas de ar, morreram-lhe os parentes
E engoma para fora.

Pobre esqueleto humano entre as nevadas roupas!
Tão lívida! O doutor deixa-a. Mortifica.
Lidando sempre! E sempre conta à botica!
Mal ganha para as sopas…

O obstáculo estimula, torna-nos perversos;
Agora sinto-me eu cheio de raivas frias,
Por causa de um jornal me rejeitar, há dias,
Um folhetim de versos.

Que mau humor! Rasguei uma epopeia morta
No fundo da gaveta. O que produz o estudo?
Mais uma redação, das que elogiam tudo,
Mas tem fechado a porta.

A crítica segundo o método de Taine
Ignoraram-na. Juntei numa fogueira imensa
Muitíssimos papéis inéditos. A Imprensa
Vale um desdém solene.

Com raras exceções, merece-me o epigrama.
Deu meia-noite; e a paz pela calçada abaixo,
Um sol-e-dó. Chuvisca. O populacho
Diverte-se na lama.

Eu nunca dediquei poemas às fortunas,
Mas sim, por deferência, a amigos ou artistas.
Independentemente! Só por isso os jornalistas
Me negam as colunas.

Receiam que o assinante ingénuo os abandone,
Se forem publicar tais coisas, tais autores.
Arte? Não lhes convém, visto que os seus leitores
Deliram por Zaccone.

Um prosador qualquer desfruta fama honrosa,
Obtém dinheiro, arranja a sua “coterie”;
E a mim, não há questão que mais me contrarie
Do que escrever em prosa.

A adulação repugna aos sentimentos finos;
Eu raramente falo aos nossos literatos,
E apuro-me em lançar originais e exatos,
Os meus alexandrinos…

E a tísica? Fechada e com o ferro aceso!
Ignora que a asfixia a combustão das brasas,
Não foge do estendal que lhe humedece as casas,
E fina-se ao desprezo!

Mantém-se a chá e pão! Antes entrar na cova.
Esvai-se, e todavia, à tarde, fracamente,
Oiço-a cantarolar uma canção plangente
Duma opereta nova!

Perfeitamente. Vou findar sem azedume.
Quem sabe se eu depois, eu rico e noutros climas,
Conseguirei reler essas antigas rimas,
Impressas em volume?

Nas letras eu conheço um campo de manobras;
Emprega-se a “reclame”, a intriga, o anúncio, a “blague”,
E esta poesia pede a um editor que pague
Todas as minhas obras…

E estou melhor; passou-me a cólera. E a vizinha?
A pobre engomadeira ir-se-á deitar sem ceia?
Vejo-lhe a luz no quarto. Inda trabalha. É feia…
Que mundo! Coitadinha!
                                                           Cesário Verde

2 comentários:

Comentários: